quarta-feira, 27 de julho de 2016

Semente


 Acordei, olhei para o relógio. Ainda cedo para levantar, tarde demais para uma boa noite de sono.  Estava triste e muito de mim era sentido como pequenos espaços vazios contornados com dúvidas e preocupações densas, dessas que a gente sabe que logo não existirão mais. Mas naquele momento estavam ali. O desconforto de não se abrir completamente, nunca é algo que todos nós conhecemos. Todos, um universo nunca completamente revelado, em suas dimensões, catástrofes, criações.

Talvez esta seja a principal luminescência que surge em novos relacionamentos: a esperança de poder ser quem se verdadeiramente é. Mas logo, logo, surgem as limitações. Uma palavra que soa mal, um ato que gera desconfortabilidade, uma essência que se perde.  Algo que se evita para não parecer acusação, a ironia que se tenta ignorar, a frase inocente que pode desencadear um avalanche. Quando se percebe, há um molde. Um molde quente e apertado, onde não há espaço para ilusões ou esperança. Algo que nos torna crus. Algo que nos trona cruéis. De tanto nos lapidarmos para servir a quem nos aguarda em expectativa, nos olhamos nos espelhos e temos dúvidas do que vemos. E damos razão a quem aponta e diz que poderíamos ser melhores. Ora, talvez fôssemos melhores se não nos tivessem cortado as asas, as ilusões, a imaginação.

Mas não somos mais donos de nós mesmos.  O que é isso que nos tornamos quando optamos por dormir ao invés de lutar contra as formas que nos cercam? Estamos mais sensatos? Mais acomodados? Trocando a razão pela paz? Alguém disse que sofrimento, na maioria das vezes é cansaço.  Mas o pior dos cansaços deve ser aquele de quem se sentou e não caminhará mais.Daquele que não grita mais, não se sente sufocado em meio a tantas regras para se domar o que temos de mais puro e humano. De tanto se apertar em uma forma de concreto, muitos viram pedra.

E é nisso que pensei nesta manhã. Não quero ser pedra. Quero ser paisagem, com flor e jardim. Que podem, que cortem, que queimem. Ali pretendo estar buscando reviver em cada semente do que restar do que verdadeiramente sou.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Um pequeno manual sobre nós, mulheres

        Algumas poucas palavras para dizer o que queríamos que vocês, homens, soubessem sobre nós. Pra começar, é preciso que ao ler tais palavras, sinta-se olhando nos meus olhos, assim, como quem não perderá uma letra sequer destas que irei expressar:
       Quando uma mulher diz sim para você, ela diz não para tudo o que a leva para longe de ti. Ela sabe que vai sentir saudades das baladas, de sair à noite sem dar satisfações a ninguém, de poder desligar o celular e voltar só na manhã seguinte. Mas ainda assim, prefere a sua presença a noite para ver um filme qualquer e acordar pela manhã envolta em seus braços. Ela sabe que vai se corroer por dentro quando olhares para outra e que vai sentir uma lágrima no rosto quando você não puder atender o celular, mas também reconhece que se arrepiará toda quando você beijá-la no pescoço e a abraçá-la fortemente. Ela sabe das bagunças que você deixará pela casa, sabe da toalha que ficará jogada no sofá e que suas meias nunca estarão no lugar certo. E ainda assim, prefere estar contigo a ver sua casa arrumada.
    Por isso, quando acordares pela manhã, abrace-a. Nós mulheres gostamos de olhos nos olhos e gostamos de elogios quando estamos vestidas de pijamas e descabeladas, ainda com os olhos apertados de sono. Gostamos do "Eu te amo" inesperado, de atendermos sua ligação e de sermos chamadas de "seu amor". Gostamos que nos conte como foi o seu jogo de futebol, assim como queremos que vocês se interessem pelo nosso dia. Nós seremos infinitamente inseguras por imaginar que você passará na rua por mulheres muito mais belas, e na verdade, sempre desconfiaremos que vocês nunca saberão ser tão fiéis como nós, que relacionamos ao amor a fidelidade até em pensamento. E na verdade, saiba que não é bem assim. Nós também temos um passado, temos aquele "ex" que marcou, por quem já sofremos e no qual pensamos às vezes. Mas vocês não, vocês não devem pensar nestas coisas, porque o amor que lhe damos é tão, tão maior!
      E toda aquela independência que ela demonstra no trabalho, na casa, com a família se dissolve quando você diz que não poderá ir vê-la. Acredite, qualquer frase que soe como um "não" terá efeito sobre aquele delineador, que transformará sua face em um desfigurado quadro de Picasso, não compreendido, inexpressivo, dolorido. E quando ela ficar nervosa, não brigue, porque só o seu carinho poderá trazê-la de volta à paz. Não veja um relacionamento como uma competição, mesmo quando ela der isso a entender. Compreenda suas imaturidades como ela compreende as suas. Compreenda-a como naquele dia em que no supermercado vocês trocaram olhares e ela disfarçou estudando a tabela nutricional do leite em pó. Não deixe, nos momentos tristes, que fique no ar o vazio das palavras que você não disse.
     Sei que por trás destas palavras, você encontra subliminarmente o conselho: "- Seja responsável por carregar arduamente o fardo das expectativas dela." Mas não é bem assim. Ela será a pessoa que estará ao seu lado durante suas crises existenciais, que vai cuidar do seu joelho arranhado como se cuida de uma criança. Ela vai sorrir seus sorrisos quando você falar coisas absurdas e vai aceitar assistir o jogo da Eurocopa do seu lado mesmo que esteja desmaiando de sono. Ela vai vigiar teu sono como quem não precisa dormir e brigar contigo pelos seus ( eu disse "seus"!) objetivos. Cuida desta mulher que agora lhe parece tão frágil, tão menina... E ela se mostrará um guerreira ao teu lado, com garras, unhas e dentes defendendo-o.

Você já conhece o caminho, não finja que ele não existe.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Que seja



Que seja intenso como sol,
e claro como céu e noite estrelada.
Que nos precipícios da vida,
sejam duas mãos firmes.


Que quando meus olhos se assemelharem
a um quadro psicodélico borrado por maquiagem,
esteticamente inaceitável,
eu possa sentir suas mãos em meu rosto.


Que seja real, e mantenha-se límpido.
Que ao tirar-me os pés do chão,
faça-me voar longe, pensar alto e rir sozinha.
Que leve-me de volta aos dez anos de idade,
que pareça-me ter vivido muito mais que vinte e cinco.


Que nada nem ninguém eternize,
que  haja respeito em cada deslize,
que não se espere, não se desespere,
Não se remoa, não se remova.


Que não seja preciso falar demais
para se dizer o que ninguém deveria ouvir,
Que seja porto, que seja fuga, ou seja lá o que for,
Que seja confiança.


E que no fim, sempre certo fim,
que não se pareça um pedaço do corpo arrancado.
Que seja leve e possa espalhar-se suavemente no ar,
como as pétalas de um dente de leão, 
após o sopro de uma criança.


Amém.

sábado, 1 de maio de 2010

A Carta



Caríssima,


Sei de teus anseios, de tuas virtudes e vícios. Sois complexa, e imagino como deve ser viver entre estes extremos de amar o singelo e jamais se contentar com pouco. Além disto, sois extremamente individualista e não lhe faltam argumentos para defender suas metas, estas que não gostas de chamar de sonhos. Faço o que posso para que não entremos em conflito, e não tens me decepcionado. Vejo como me segue fielmente, mesmo quando todos estão duvidosos de nossa razão.


As vezes sussurro uma música que fica o dia inteiro flutuando como uma pluma em teu dia, outras lhe mostro o quanto amais algumas pessoas que se fazem presentes. Choras, sentes arrepios e eu observo. Sensibiliza-se ao ouvir o nome de tua mãe, ou ao ver uma criança sorrindo. Mas conservas esta postura de insensível perante a maior parte de seu convívio. Afastas de ti toda e qualquer ameaça a esta tal liberdade, esta que nunca sabemos como encontrar, e o que faremos com ela posteriormente. Tudo é desafio para ti. Mas tua saudade transborda, e juntas, eu e tu, buscamos compreender de onde ela vem, a que se direciona.


Proponho que pense a respeito disso, desta saudade. Teu individualismo me faz pensar que sentes falta desta que foste, desta que serás. E vou mais além: Sentes saudades do que és. Por que sois tão intensa que precisas ser ainda mais livre,sempre, abrindo espaços ao seu redor para manifestar toda a sua natureza.


Desta que lhe acompanha em cumplicidade,


Tua Consciência.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Reflexão Psicodélica - Aleatórias Sensações






Às vezes, ao abrir esta página, me deparo com expressões que são minhas, mas que não sei interpretar.  Observo que escrevo quando algo não está bem, como se tentasse guardar em mim a fortaleza, e despejar aqui as fraquezas que palpitam e latejam na minha alma. As palavras as vezes me soam repetitivas, embora eu saiba que o que eu sentia não era bem o que escrevi. Existem coisas que se perdem, que ultrapassam limites de compreensão, e acabamos por ver aquilo que queremos para de alguma forma nos abrigarmos em entrelinhas. São sentimentos, situações, ações e reações que brotam com tal firmeza, acontecendo tão rapidamente que pouco consegue-se usufruir destes. A forma como tudo aparece e desaparece na minha vida - em mim - chega a me assustar. Nascem, crescem com intensidade, dançam ao som de um suspiro e estremecem diante de minha visão enquanto minhas pernas parecem perder o foco da sua função de sustentar meu corpo. E o suspiro que eu pensava ser de expectativa deixa um doce e amargo sabor de adeus. Estranhamente, tudo se vai. Não deveríamos nos sentir assim, já que estas são apenas mais algumas sensações, como outras que se foram, e ainda virão... Queremos que tudo seja eterno, mas que seja da mesma forma como foi no momento do auge, do esplendor.


Não entendo esta reencarnação que as pessoas teimam em criar para o que está morto. Sequer posso compreender como são impostos nomes aos sentimentos e sensações. Amor, paixão ou até mesmo... dor.
Somos todos tão diferentes, são tantas as intensidades, as maneiras de sentir, então por que criar paradigmas até mesmo ao abstrato que nos compõe? Por que não vivenciar novas emoções ao invés de nos deitarmos sobre o túmulo, lamentando aquilo que sequer nos faz falta? Qual o nome se dá a essa estranha sensação de querer o impossível, sabendo que se o possuíssemos tentaríamos mudá-lo? Esta dor parece ser necessária à nossa sobrevivência.

Esta semana alguém me disse:
"- A dor é a fraqueza saindo do corpo."

Imediatamente penso em outra, como se estivessem interligadas - ainda que pela dor- de certa forma paradoxalmente:

Essa morte constante das coisas é o que mais dói.
Dói quando não se habitua, dói quando se acomoda a vê-las morrerem e nota-se que isso já não tem mais importância.E talvez, quem sabe? Doeriam também se permanecessem vivas.

E quando não é o corpo que dói?   Talvez tenha o mesmo sentido, ou não.

A questão, é que esta dor leve, que sopra aos meus ouvidos quase imperceptivelmente, traz a sensação de fragilidade, impulsiona a busca por algo intenso, que se relacione à grandeza.  E penso alto por alguns segundos:

- Meu coração está vazio.

Pareço cálida, ácida. E ao mesmo tempo, um sentimento lírico, urgente, reverente à vida.
Sentimento este que não sei nomear.




domingo, 27 de dezembro de 2009


Transbordava em teu olhar um desejo sublime, e embora nada anunciado eterno me comovesse, senti minha alma sintonizar-se à tua, como se momentos não se decaíssem a um fim previsto. Como uma taça de vinho que se trincava, vi a ternura com que a terra sugou o que havia sido derramado. Entre todos os sentimentos que se exibiam para serem escolhidos nos seus olhos, optei pela beleza de tudo o que havia de mais puro, e vi o quão humana pode ser uma espécie teoricamente racional. Senti seus sorrisos palpitando em meus pulsos, teus passos deslizando em direção à aceleração de um coração que mal podia esperar.

Contudo, não pude, no fim esconder minha alegria ao observar a fertilidade de minha imaginação. Dei-te flores, e ao enterrá-las sob o lodo, deduzi que estaria a fixar suas raízes no chão. E tudo que vi, a verdadeira face da transparência, não passava de um espelho que colocaste diante de mim, enquanto gargalhavas com toda tua pequenez, por detrás dos reflexos que eu via.

Oh, rei,te esqueceste, podes ser pequeno aos olhos de alguém sem que estejas no alto do firmamento. Na altura em que alcancei,o vi pequeno,e teus detalhes se esconderam.
Foi mesmo quando a queda determinou-me a aproximar-me de ti que pude vê-lo em teu tamanho real. Sim, eras realmente um grande homem. Talvez alguma inteligência pudesse se esconder sob aquele talento nato que pude ver neste momento... O talento de refletir alguma verdade no que por debaixo de sua mediocridade ,era, na realidade, falso.

Ainda assim, pude me orgulhar. E encontrei felicidade ao relembrar quantas cores pude refletir ao deparar-me ao negro veneno que havia em tua alma.

Confissões ao fim do ano


São promessas demais. Sonhos demais. Poucas metas, muitas ilusões.
Não consigo fazer com que as palavras "sonho" e "esperança" encontrem em mim acolhimento receptivo.
Talvez por que sonhar me pareça cômodo e esperança tenha alguma relação com "esperar".

Palavras estas minhas que possam refletir uma voz deprimida e desprovida de ânimo, mas esta não é bem a realidade. Por que não posso mais me conformar com  todo esse mundo que se perde nas palavras e que pouco modifica, eu preciso de ação, eu preciso de vida. Eu quero a adrenalina percorrendo minhas veias, e ao fim da noite a calmaria de um deserto em uma alma que em tão pouco crê, mas que tanto busca.

Não me deseje a paz, deseje-me coragem para cada desafio. Não saberia viver nesta vida pacífica que vocês imaginam, com flores e animais no quintal, sentada na varanda enquanto a idade se aproxima. Quero o descanso na beira do mar depois de percorrer quilômetros com o coração pulsando acelerado, quero o abraço que faz com que lágrimas surjam em meu olhar. Quero esse amor que as vezes dói... Dói como algo que não cabe mais no peito e precisa sair e envolver o mundo. Quero amigos que me liguem pela madrugada e digam que estão sem sono, que precisam conversar. Quero a criança que se perde na praça, de joelhos no chão procurando sua bola de gude. Quero o bom dia do gari sorridente as 5 da manhã. E quero deixar essa mania de querer tudo, de não querer nada.

2010 - Eu não quero renascer. Não quero enriquecer.

Eu quero respirar e aprender, apenas.

E ver a felicidade de quem amo iluminando seus olhares.